sábado, 16 de junho de 2012

LIVRE ARBÍTRIO


        Se não tívessemos o livre arbítrio, talvez seria mais fácil sermos felizes. Ter domínio sobre nossos pensamentos, sentimentos e atos pode nos levar a escolhas erradas. Quase sempre somos prejudicados por elas, pois são elas as mais fáceis, as mais práticas. 
        Temos o livre arbítrio de escolher entre o bem e o mal. Este nos é apresentado como algo atraente; aquele, como algo maçante, algo difícil de se conseguir. O bem exige de todos paciência, trabalho penoso e perserverança. Embora saibamos que escolhas erradas nos levarão a grande arrependimento, não as suprimimos de nossa vida. O tempo presente nos deixa cegos e importa para nós o falso bem-estar passageiro. Normal adiarmos tarefas cansativas e nos submetermos à ociosidade, deixando de cumprir nossas obrigações. A inconsequência nos parece inata. Mas isso é uma ilusão muito distorcida dos nossos sentimentos. Já nos dizia uma canção do grupo Legião Urbana: “Disciplina é liberdade...” Infelizmente, abusamos de nosso poder de arbitrariedade e nos deixamos envolver pela indisciplina cotidiana. 
        Todo livre arbítrio inconsequente resulta de nosso egoísmo, de nossa indiferença em relação ao próximo. No entanto, quando começamos a pensar nas pessoas ao nosso redor, na labuta de cada um e permitimos que o amor nos conduza a algum lugar, nossa existência toma uma outra direção, que nos faz tomar decisões certas e, assim, as nossas escolhas já não são guiadas pelo livre arbítrio, mas pelo amor que nunca erra nem nos deixa errar. Se houve erro, não era amor. 

(Luciene Lima Prado)

sábado, 26 de maio de 2012

ISQUEIRO

(Conto pequenininho)


Eram muitos desaforos, muita violência, muito horror, por dentro e por fora daquele homem.

Sozinha. Ela, as roupas dele e um isqueiro novo.

 Queimaria tudo, talvez se mataria. Tudo faria se o "maldito" amor não a segurasse.


(Luciene Lima Prado)

quinta-feira, 17 de maio de 2012

A VIDA É MAIS OU MENOS UM JOGO DE XADREZ

      Estamos nós dois, presos a um jogo de xadrez. Meu adversário a pensar numa boa jogada, como bom estrategista que é; e eu a fingir que jogo. 

      A vida se compara a esse jogo desafiador, em que sempre existem aqueles que são vencedores, pois se esforçam para fazer o melhor que podem e sempre vencem; outros como eu, capazes de alguma vitória, mas são medrosos, não se esforçam e desistem de ir até o fim. 

      Agora, estou entregando meu jogo, querendo mesmo desistir, mas meu parceiro diz que não posso movimentar a peça que quero, pois estou em “xeque”. Pouco entendo desse jogo. Por mim, ele já teria acabado. 

      Como um jogo, não basta apenas viver, é preciso saber o que fazer, como agir na hora certa e nunca fugir ou se entregar diante de um obstáculo. 

      Chegamos ao fim. Se eu aplicasse todo meu potencial no jogo, usasse de alguma criatividade, pode ser que eu ganharia. Seria um milagre. Os covardes sempre estão em busca de um milagre. Na verdade, milagres vêm quando fazemos algo para merecê-lo. Igual ao que diz o ditado: “Faça tua parte que eu te ajudarei.” E ainda existe aquele outro: “Sem sacrifício, não há recompensa.” E no momento, vou me lembrando de uma frase cujo autor desconheço: “Mais vale as lágrimas de nunca ter vencido do que a vergonha de nunca ter lutado.”

      Então é isso, alguns se preparam mais e, mesmo perdendo, continuam jogando-vivendo; enquanto há aqueles que, por acharem que são realmente perdedores, nunca vão tentar vencer. 

      Enfim, espero que, nesse momento de reflexão durante o jogo, eu tenha aprendido a lição. Mas isso é coisa para eu testar outro dia, porque esse jogo de xadrez me deixou de “miolos quentes". 

(Luciene Lima Prado) 

sábado, 12 de maio de 2012

COMEMORAÇÃO SOLÍTÁRIA



COMEMORAÇÃO SOLÍTÁRIA

   Hoje festejo meu nonagésimo terceiro aniversário. Sozinha mesmo. Sem família, sem ninguém para se lembrar desta data. 
   Vou comemorar meus noventa e três anos com alegria. Uma vez na vida tenho que me presentear com um dia assim. Meus remédios não vou tomar hoje. Nada de privação em relação à comida, nada de não poder fazer isso ou aquilo. No meu aniversário posso tudo. 
   Nesta data mereço relaxar, apesar da saudade, das mágoas e de tudo que machuca meu coração. Vou fazer uma festa solitária. 
   Não vou recordar dos poucos momentos bons que vivi. Não me interessa o passado, mas o dia de hoje, a alegria que sinto, mesmo sendo fantasia. Quero inventar meu instante de felicidade, porque não sei até quando estarei viva. Talvez eu morra daqui a pouco. 
   Nossa! Não quero interromper meu curto tempo com pensamentos. Onde estará aquele vestido que usei no casamento da minha finada amiga Roberta? Ah! Está ali naquela caixa. Eu o guardei como lembrança daquele dia. 
   Ai! Que difícil pra eu me abaixar... Ui! Hum! Pronto! Aqui está ele. Olha que lindo! Ah, Saudade! Xô, saudade! Quero viver este momento agora!
   Vou imaginar que estou em um baile onde sou a mais bela. Olha quantos rapazes bonitos olhando pra mim! Lá, lá, lá, lá, lá... 
   Hoje é meu aniversário de 15 anos ! Meu aniversário... meu anivers... meu an... mmm... 


(Luciene Lima Prado)

quinta-feira, 15 de março de 2012

UM COTIDIANO DOLOROSO

      Ele chegou, entrou e viu a esposa sentada no sofá. Ela usava um short de lycra e uma camiseta grande, sem estampa. Tinha os olhos vermelhos e inchados, semblante bastante abatido. Ele a olhou com cara feia e perversa. Estava bêbado. Isso acontecia todas as noites.
      A mulher, assustada, encolheu-se no canto do sofá; mas ele, com fúria, puxou-a e deu um tabefe bem forte em seu rosto. Disse-lhe palavras ásperas, humilhou-a como se ela fosse a pessoa mais desprezível do mundo.       
      Ela não tinha forças, há muito não conseguia se alimentar. Não havia para onde ir, não tinha mais família. Aquele homem era tudo que ela achava que tinha. Talvez lhe restasse alguma dignidade, mas ela nem sabia se havia alguma dentro dela.
      Não contente por bater no rosto da mulher, ele fez questão de contar a ela sobre as mulheres com quem tinha ficado aquela noite. Descrevia-as como verdadeiras sereias, e como elas o deixavam viril. Fazia entre elas e aquela mulher acuada diversas comparações: como ela era desprovida de sensualidade, de beleza e de inteligência. Gritava, chamando-a de imprestável.    Ela soluçava. Ela tentou dizer alguma coisa, mas ele lhe deu um murro na sua boca. 
      Após humilhar bastante a mulher, ele trancou a porta da casa, ameaçando matá-la caso ela fugisse ou contasse alguma coisa para alguém. Ele dirigiu-se para o quarto e exigiu que ela dormisse no sofá.

      No dia seguinte, antes do café da manhã, ele saiu sem dizer nenhuma palavra. Ela não quis comer nada. Cansada, foi em direção ao quarto, o mesmo que seu companheiro não quis que ela entrasse na noite anterior. Viu a roupa dele sobre a cama. Checou os bolsos e encontrou um bilhete: 
      “Meu querido, espero ansiosa por seus beijos e abraços. Todos os dias você me diz coisas tão lindas que toda mulher gostaria de ouvir. Por sua causa tenho me sentido a mulher mais feliz do mundo. Quando se livrará daquele trapo que é aquela mulher com quem mora? Eu te amo.”

      Nenhuma assinatura. 

      Desamparada, não teve força para chorar. Devagar abriu a porta do guarda-roupa e ficou, por vários minutos, olhando as roupas do homem que um dia a assumiu como mulher e agora a jogava fora da vida dele. Lentamente, pegou uma tesoura que estava sobre a penteadeira e tornou a olhar as roupas dele. Pegou a melhor camisa e, com a tesoura na mão, pensou em cortá-la em pedaços. Tomaria coragem e fugiria daquela casa, mesmo sem ter para onde ir.
      Pensativa por certo tempo, ela colocou de volta a camisa no lugar, guardou a tesoura em uma gaveta e foi arrumar a casa. Novamente, sentou-se no sofá à espera do mesmo homem que chegava bêbado em casa, batia-lhe no rosto e a humilhava todas as noites.

(Luciene Lima Prado)

domingo, 11 de março de 2012

A POESIA NO DIVÃ

   -Senhora Poesia!
   - Sou eu.
   - Sente-se no divã.
   - (...)
   - Conte-me sobre você.
   - Eu estou com crise de identidade. Não sei mais quem sou. Não acredito no que eu mesma versejo.
   - Há quanto tempo se sente assim?
   - Nem faço idéia. Acho que faz muito tempo.
   - Fale mais.
   - Eu não consigo mais saber o que sinto. Às vezes estou triste; outras vezes, alegre. Numa hora quero viver eternamente; na outra, quero morrer. Eu ando ouvindo o canto das estrelas. Estou ficando louca. Por algum momento, me organizo metrificamente; em outro momento, meu “versamento” se perde em versos brancos.
   - Algum problema na vida amorosa?
   - Todos. Eu amo demais e, no mesmo instante, odeio infinitamente ou um segundo sem fim. Então, torno a amar além da primavera.
   - Que lembranças lhe trazem a sua infância?
   - Já não sei mais a minha idade. Pareço ter todas as idades. Na infância, eu gosto de brincar de rima fácil, de rodopiar etc. Na adolescência discordo de tudo, apaixono-me... Já não sei mais. Na idade adulta, reflito sobre tudo, creio em tudo e não creio em nada. Fico querendo me matar ou viver e transmitir minha vida pra quem eu encontrar. Na velhice, tudo recomeça e tudo acaba e tudo vira do avesso. Nem faço idéia se o que eu disse agora é mentira ou verdade.
   - Seu problema é poeticidade múltipla associada a uma confusão conotativa com resquícios de denotação, cujo tratamento se baseia em deixar as folhas em branco por várias horas o máximo de tempo que puder.
   - Assim poderei ficar curada, doutor?
   - Talvez. Com muita disciplina e pouca imaginação, certamente!
   - Eu certamente já estarei extinta. (A poesia, em voz baixa.)
   - O que disse, dona Poesia?
   - Divagações, divagações...
   - E o tratamento prescrito?
   - Eu o cumprirei até o nascimento de um novo poeta.

(Luciene Lima Prado) 



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quarta-feira, 8 de fevereiro de 2012

NOSSOS FILHOS

    Amemos nossos filhos com o amor mais sagrado que temos. O paraíso deles é o nosso coração, onde eles repousam e se fortalecem. 
   No entanto, se nosso coração não tiver o amor necessário para lhes dar, saibamos que o vigor deles poderá ser consumido aos poucos. Pois não terão descanso nem a energia que só nossos corações poderão lhes conceder. Viverão se arrastando, sem apoio, procurando em vão ser felizes, e a felicidade será adversa a eles.
   Que saibamos amá-los com a força maior do coração. Porém, sem esquecermo-nos de que a razão estará no controle de nossas atitudes. Seja nos momentos alegres ou naqueles em que a dor nos abate, nossos filhos possam encontrar em nós a sabedoria e a confiança. Sejamos firmes sempre, sem perder a doçura nem o dom de aconselhá-los. 
   Todos os dias ou a cada instante, devemos abençoar nossos filhos ainda que eles não nos peçam por isso. Nas orações tenhamos fé em Deus e a Ele entreguemos, sem titubear, a segurança deles. Enfim, amemos nossos filhos como o bem mais precioso dado por Deus, sejam eles como forem ou como estiverem. Lembrando-nos de que os filhos são para serem amados sempre, mesmo que eles nos amem bem menos. 


(Luciene Lima Prado)